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sexta-feira, 30 de novembro de 2012

     O Perdedor



Ainda consigo ver os fatos
acontecendo de forma tão nítida,
que em certos momentos
 a dor chega a ser latejante.

Vivo,
respiro,
e enxergo
tudo a minha volta.
E isso basta para compreender
o quanto a vida é
medíocre e barata.

Ela usa todas as energias
ao longo da existência,
e descarta como
uma puta qualquer.

No final tudo é perda,
perde-se quando ganha.
Tudo esvai-se com rapidez.

A realidade é tão cretina,
e a emergência em sentir-se alegre
é tão precisa
quanto o sangue correndo e
espalhando-se dentro do corpo.

A busca por algo recompensador
surge a cada segundo,
precisa-se ser feliz,
completo,
de tudo disposto.

Ganhadores,
vencedores,
detentos da verdade,
completos,
o tudo.

E no fim,
o nada.
Nada além que carne e ossos,
corpos andantes,
em busca da perfeição.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012


Brindemos a morte enquanto vivos estamos, respeitando aqueles que já não brindam e estão a sete palmos de terra. Que a vida seja aproveitada como um passeio na floresta, aguardando seu desfecho onde o fim de outro inicio se começa.

Os copos se chocam.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012


Portugal, 18--. Era agosto e um vento uivante mantinha todos dentro de suas casas. Bebíamos num bolicho chamado "não lembro". Quatro, cinco ou seis garrafas de vinho foram o suficiente para que um dos gambás - ou aspirante - coloca-se algo para fora. Pois assim se sucedeu, depois de vomitar toletes gomosos - cremes gástricos que fediam à carniça temperada, começou:

- Dessa vez lembro-me que caguei as calças! Ocorrera à exatos dez anos atrás, inesquecível - diabólico! - marcou minha alma como o ferro em brasa há de marcar a pele dos que o merecem. Diz-se que o Diabo em pessoa anda pelo mundo, fantasiado de pobre, de mulher e de criança - tentando os filhos Do Homem, com promessas e mentiras. Pois bem, creio que desta vez o fazia na forma de um menino...

Todos nos ajeitamos nos bancos, apinhando-se diversas pessoas na volta do velho corcundo que de súbito tomara a atenção de todos os que escutaram a vaga introdução de sua história. Pediu um cigarro que foi-lhe dado. Fumou-o pesadamente enquanto pediam pelo continuar de seu depoimento. Estava bem ao seu lado e ouvi de toda a narrativa, podendo-a transcrever com exatidão:

- Borrei-me - sim! - mas não sou covarde, veja bem. Estava na rua - dormindo na rua - era madrugada, fazia frio, estava bêbado, com fome, congelando... mas nunca fui um covarde. As noites de calçadas negras e horizontes embaçados são hostis à vista; sempre acompanhadas do semi-oculto, um perigo iminente, uma atmosfera inquieta, rasgada apenas pelos grilos demoníacos em uníssono. Eu adormecia em nichos sombrios, onde conversava com figuras vagas e mortiças, emergentes dos cantos menos conhecidos da cidade. E numa destas noites - lembro-me do luar esverdeado escorrendo do céu -, meio dormindo, meio acordado, vislumbrei pequeno vulto em meio às nevoas noturnais que envolviam as casas e esquinas...

- ERA UMA CRIANÇA E DISSE-ME SER SEU PAI!!! MAS COMO - COMO?! - SERIA EU SEU PAI SE - E O INFERNO É SABEDOR - SOU UM DEMÔNIO FUGIDO DAS GARRAS DO PRÓPRIO SATANÁS?!!!

Seu corpo esfarelou criando uma nuvem de podridão e terror.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Roleta-russa

Ondefoipararolimite?nãoénumquartorodopiandoqueteremosaresposta.segureagolfada.oumetaodedonagoeladumavez.amoedapodeter4oumaislados.encaretodasaspossibilidadesetomeumadecisão.nãodevemosficarestagnadosnestelixo.nãofaçaperguntas.osgrilosnãoteentendem.segureaspontas.oupercaocontroledevez.fecheosolhos.estáchegandotuavez.tuéabaladestaroleta-russa.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Lembro de um par (claro) de olhos castanhos por de trás dos aros de seus óculos. Como um animal arisco, hesitante. Espiando o ambiente o qual faz-se integrante, ainda que não voluntariamente. São tempos difíceis, todos possuímos coisas pendentes... uma esteira infinita de circunstancias e oportunidades, ora aproveitadas com exito, ora não...

Da-se jeito.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

- Abandonar o Navio!



 Perdemos nossos empregos; por picuinhas, eu sei, não temos mais aquela insana vontade de trepar em qualquer lugar por aí também. E nem mesmo a boemia nos interessa mais, eles tomaram conta, perdeu a graça. Perdemos o respeito um pelo outro, brigamos, descemos o sarrafo. Perdemos nossas economias em máquinas caça-niqueis, principalmente aquela do Nosso Bar. Culpa daquele desgraçado do Cachoeira. Perdemos nosso status de bons vivants, vendemos nossa coleção de discos por mixaria, meu LP do Liverpool também se foi.

 Façamos a média de todas as tragédias. Tem uma balança logo ali. Perdemos tanta coisa, mas ainda temos nossa dignidade, o brabo é que esqueci onde pus a minha, já que sempre a deixava em casa, para não correr o risco de perdê-la por aí.

 Procure-a na privada, quem sabe não esteja lá, pois a descarga está estragada há 5 meses, talvez ela esteja boiando.Vamos, pegue as luvas de borracha e um prendedor para o nariz.

 Senão fudeu.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Escrever é fácil, o difícil é absorver a mensagem e usar para sí próprio. Vinícius Englert.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Lâmina

Uma torneira pingando. Cortinas fechadas. Ela chorava, agachada num
canto, não estava confusa ou indecisa, simplesmente aguardava o
momento certo, pois sabia que era inevitável. Olha para a lâmina que
deixara entre seus pés e para a sombra que os poucos móveis faziam na
parede de tom pastel.
Então uma certeza se apossa dela, e sente como se um fósforo tivesse
sido riscado entre seus olhos. Suas lágrimas secam.
E agora não era somente a torneira que pingava.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Preciso ficar bêbado para suportar as pessoas e essa vidinha
contraproducente. Acho que pelo menos o que escrevo venha a valer
alguma coisa (falo dos poemas, não isso), estou juntando material para
o meu livro de estréia, totalmente independente e fadado ao fracasso,
mas foda-se.

Agora mesmo estou escutando Etta James e tomando cerveja no bar 666.
Concentrem-se no que escrevo, não na minha pessoa, sabe como é:
ranzinza, arrogante, enfim.

Trocando-me por merda, sai-se no lucro.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Espetáculo

 10:36. Eu detesto chegar em casa de manhã, ainda mais numa segunda-feira. Fui ao puteiro ontem. É. Fazia tempo que eu não explodia a cabeça do meu pau dentro de uma buceta. E cheguei incólume, sem arranjar nenhuma confusão, talvez por causa da
cocaína, que me deixa mais pragmático e sóbrio, o problema é a cartilagem do meu nariz, que já anda toda esgualepada. Tem gente que usa cocaína em supositório, para evitar esse tipo de coisa. Não faz meu estilo. Não mesmo.

 Não sou o genro que todos os pais gostariam de ter, e ser um sujeito exemplar não está na minha lista de início de ano. Essa lista sequer existe, na verdade. Sou um desajustado, eu sei, não me enquadro nos padrões da sociedade, seja lá qual for esse padrão. Também não me orgulho do que tenho feito, ou do que farei depois disso.
 É isso aí. O Espetáculo da Decadência, terminando seu 1º ato. As cortinas se fecham lentamente.
 Clap, clap, clap, clap...

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Expresso

 -Agora ninguém sabe onde estou, -disse-me ele, enquanto aguardávamos sentados num banco pelo ônibus -nem conseguirá falar comigo ao telefone, ele estará desligado, ao menos para aqueles que quero. Só falarei com quem eu quiser. Encontrarei quem eu quiser. Isso tudo porque cansei, entende? As pessoas me sugam e não sobra muita coisa. Não vá pensar que eu seja esnobe, arrogante ou me achando superior ao ignorar a todos, mas é que não tenho nada a oferecer, por enquanto. Eu não devo satisfações nem explicações de natureza alguma. Agora ninguém sabe onde estou. Ninguém. E é isso que eu chamo de liberdade.

 Eu desconhecia aquele sujeito, nunca o havia visto na vida e tampouco sabia porque começara a falar tudo aquilo comigo. Seus olhos eram tristes e apertava de vez em quando o olho esquerdo, como se sentisse dor de cabeça ou algo parecido. Cheirava a bebida e acendia um cigarro atrás do outro, sua mão tremia.
 Quis perguntar a ele o que o havia deixado naquele estado, mas fiquei em silêncio. Embora ele me parecesse confuso e perturbado, senti que suas palavras eram verdadeiras e decididas. De repente ele puxa um caderninho do bolso do paletó e começa a escrever alguma coisa. Depois pára e fica com uma expressão vazia no rosto, parecendo ter esquecido do que ia escrever ou perdido o ímpeto, e muda para uma cara de dor. Eu não poderia ajudá-lo, e temia que ninguém pudesse fazê-lo.
 Então avistei meu ônibus, despedi-me dele e subi no veículo. Lá dentro, através da janela, vi-o ainda sentado, olhando para o nada.
 Talvez seu ônibus nunca viesse.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Passeio pela Rua da Barca

 Cocktail de fermentado de cana com extrato de gengibre e carvalho. Parecia bom. Comprei também dois pacotes de bolacha salgada e dois maços de cigarro. No curto período em que andei por aquela maldita rua (lixeira a céu aberto) eu me lembrei que haviam alguns poemas num dos meus blogs que estavam programados para serem publicados na terça-feira (grande merda).
 A noite passada foi terrível. Bebi tanto que esqueci onde estava, acabei faltando com meus amigos e ainda por cima caí de cara no chão, entortando um pouco mais o meu nariz.

 A insônia voltou com tudo (eu não disse "Sônia", e mesmo se fosse ela, seria um desastre igual). E isso vem a calhar com o título deste blog. A insônia é hoje um dos meus hunos, não consigo lidar com ela, detê-la, retê-la. Os remédios ajudam um pouco, mas acabam criando uma dependência no infeliz do insone. Outro dos meus hunos são as pessoas. Nunca gostei de multidões e chego a suar gelado, fazendo um esforço titânico pra suportar o troço, mas há lugares específicos onde me sinto bem, mesmo que lotados. Para o meu azar, a maioria deles são bares.

 O sol já estava no horizonte. Dobro a rua e vejo um cusco sarnento e rengo, todo fodido, que estava no outro lado da calçada. A gente se olha por um instante e depois seguimos, cada um, para sua vidinha miserável, ele entra na rua da direita e eu, na esquerda.
 Éramos iguais, e aqueles que assim o são jamais cruzam o caminho um do outro, andam em vias paralelas. E o cachorro sabia disso.
 Até mais do que eu.

sábado, 14 de julho de 2012

A lista invisível

 Alguma coisa foi perdida. De novo. Digo "de novo" justamente pelo fato de já ter escrito sobre isso antes.
Mas agora é um pouco diferente, perdeu-se algo aparentemente de maior importância (digo "perdeu-se" porque não sei se fui eu que perdi ou o quê), quase palpável. Desta vez eu estava prestes a descobrir, mas fui atrapalhado por conjeturas e pensamentos aleatórios. Talvez a noite, com suas criaturas endoidecidas e vivas tenha se transformado num cenário sem graça, com gente vazia em disputas de vaidade e de olhares de superioridade. Pode ser que ELES tenham perdido algo; em bares, mercados, no trabalho são todos iguais, com o mesmo rosto e com gestos e frases previsíveis.

 O problema do mundo são as pessoas e veja bem, estou nessa também, só que eu levo uma ligeira vantagem por saber disso. E sempre que algo é perdido, ganha-se outra coisa de igual valor, de acordo com a lei da troca equivalente. Corrijam-me caso eu esteja errado, posso estar falando um monte de asneiras, mas são asneiras sinceras e interessadas. Sim, estou preocupado. Comigo mesmo, é claro, temo que o grande problema seja eu. E neste exato momento sinto algo escapando de minhas mãos, tal qual um carrinho de supermercado lotado descendo ladeira abaixo.

 A lista de coisas perdidas está aumentando.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Entrevista de emprego

 - Veja, - ele abaixa as calças e caga em cima da mesa - merda. Essa é a merda derivada de alguns risólis, salgadinhos e a cerveja que bebi ontem. Mas não fica por aí, essa bosta é a resposta para a tua pergunta, - veste as calças e senta novamente na cadeira - é a minha reação muito bem colocada, diga-se de passagem, àquela sujeito que me roubou a namorada, com uma verborréia decorada da wikipédia; essa merda também vai para ela, pro cafetão que me expulsou do puteiro, à tia suja do boteco que me chamou de alcoólatra, à revista "alternativa" que não quis meus textos e que publica gente muito pior do que eu, aos filhos da puta que por nada me espancaram na rua, etc.

 Não estou profundamente indignado, acontece que este bostalhão à nossa frente é só a minha reação, como eu disse, nada de mais. Ah, eu pensei melhor e não vou querer esta vaga, eu iria perder muito tempo pra ganhar tão pouco, não nasci pra isso, me desculpe, sou escritor. E este vosso sistema de hierarquias é repugnante, não me admira todas essas demissões e aqueles funcionários com cara de facínoras que encontrei no corredor. Bom, tenho que ir, preciso comprar papel higiênico e tomar um banho.

 Tenha mais sorte com o próximo entrevistado.

terça-feira, 26 de junho de 2012

O casal - PARTE FINAL: CABARET MOLOTOV

 "Lembra quando começamos a namorar? Prometemos não esconder nada um do outro, mas
isso não era necessário, nossa comunicação sempre se deu através de uma espécie de
telepatia. Mas enlouquecemos, e era para ser assim mesmo, só não sei em que dado
momento nós saímos do mundo da razão. Tudo que solicitei que tu fizesse foram
ordens que recebi, sem contestar; mas precisamos pôr um fim nisso. Não somos mais
nós mesmos, estamos sob estado de sítio, não temos controle sobre nossas vidas.
Morremos há muito tempo atrás e não faço a mínima idéia de quem ou o quê está no
controle agora. Tenho raros estados de lucidez. Mas chega, isso é preciso, é a
única saída, então eu peço que faça o seguinte:
 Quando anoitecer, pegue sua Magnun 44, vá até o Cabaret Molotov, chame a atenção
de todos e dê um tiro na própria cabeça. Não hesite.

 Ana".

Ele bebia tranquilamente um mocaccino numa lancheria distante do bar onde
assassinara a garçonete. Teria ele estuprado a probre ruiva? Já não tinha certeza
de mais nada, e tampouco se importava. Ana realmente tinha razão, não havia outra
saída. Lembrou-se de que a arma estava no porta-luvas, avistara-a quando encontrou
o 1º bilhete de sua falecida esposa.
 De repente, sua visão fica totalmente escura, escuridão esta acompanhada de um
zumbido em seus ouvidos.
 Acordou dentro do carro, já era noite. O acendedor de cigarros na sua língua
deixou-o mais desperto.
 - Melhor que cocaína - disse consigo mesmo.
 O smog tomava conta daquela cidade úmida e suja, prostitutas berravam ,
endoidecidas e fissuradas. Junkies em meio a ratos e lixeiras falavam de Glória e
Redenção.
 Ele teve vontade de matar a todos e , inclusive, sentia-se parte daquilo, então
carrega o tambor do revólver e parte para o Cabaret Molotov.
 - Que vai ser, hein, meu chapa?
 - Bacanora.
 - Veja bem...o senhor sabe...esta bebida é proibida por aqui...
 - Esta pocilga toda é proibida. Veja.
 Um sujeitinho de bigode e chapéu-coco tocava um vaudeville no piano, enquanto
executivos gordos e ensebados babavam em cima das moças. A decoração era inspirada
nos anos 20, e os frequentadores, inspirados na idade das cavernas.
 - Traga minha Bacanora, não quero que seus miolos conheçam a potência de uma
Magnum 44, como esta.
 - Tá bom, tá bom. Bacanora saindo.
 - ...
 - Pronto. Taí. Ei, ei, ei, não bebe tudo assim não, isso é lava vulcânica, cara!
Ai, meu deus, vai dar merda...
 - Lamento muito não poder levá-los comigo - grita ele, subindo no piano -, estamos
todos no mesmo barco, e este barco já afundou na bosta há um bom tempo. Não há
sobreviventes nesse mundo!

 E rapidamente, ele atira, não em sua têmpora, mas logo acima de sua orelha
direita. Em meio à toda aquela correria, ele sequer sente seu corpo cair. O pouco
que sobra de sua cabeça fica de lado, e um filme muito ruim se passa em seu olho,
além do sangue. A cena vai ficando cada vez mais vermelha, e num último suspiro de
vida, ele se recorda de todos os crimes cometidos no passado e sente até mesmo uma
compaixão por aqueles pobres diabos.
 Só um pouco.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

O casal - PARTE 3: CADDY, A GARÇONETE

 Após algumas horas rodando pela cidade, ele pára num acostamento, sua mulher sabia que ele era dado à lapsos de memória, e por isso escreveu num papel que estava no porta-luvas uma lista com 2 coisas a serem executadas após o estrangulamento:
 1º: Páre em um acostamento distante da cidade, próximo à ponte, retire meu corpo do carro, passe batom em meus lábios e jogue-me no rio;
 Atirá-la na água foi fácil, o difícil foi a parte do batom, ele teve que cortar um pedaço da língua da sua mulher com seu canivete suíço, já que aquela não parava dentro da boca desta. Feito isto, ele entra no carro, acende um cigarro e risca o 1º item da folha. o 2º dizia o seguinte:
 "Vá até o bar 'Warm Beer and Cold Women' e faça sexo no banheiro com Caddy, a garçonete. Da última vez que fomos lá ela me confessou que queria te dar o rabo. Goze dentro dela, não se preocupe com isso, nem com o meu corpo boiando no rio. Eu já cuidei de tudo. Caddy está com a 3ª tarefa".
 Assim que termina o cigarro, ele dirige até o local, era perto do meio dia mas o frio continuava intenso, e estava ficando nublado. Ele estivera naquele lugar há 2 semanas com sua mulher, nunca gostou dali, exceto pela  jukebox. Sentou-se ao lado da janela, os assentos eram de um couro vermelho acolchoado, unidos às mesas de madeira. Ao avistar a garçonete, pede uma dose de vodka e assim que ela retorna com a bebida, ele diz:
 - Então...Caddy, vou ser o mais direto possível, - bebe tudo num gole só- eu tenho um puta tesão por ti e gostaria de te enrabar, ali no banheiro.
 - Como assim? - pergunta ela, fingindo estar surpresa.
 - Ah qual é? Vamos ali, eu sinto que tu também quer, pelo menos é o que os teus olhos me dizem agora.
 Ela sorri com o canto da boca e então fala:
 - Entre na última casinha do banheiro feminino daqui a 5 minutos, também tenho um envelope teu.
 Passado este tempo, ele vai até lá, certificando-se de que ninguém o estava cuidando. Caddy realmente era uma ruiva muito gostosa, e um tanto maluca; sem muita demora, eles partem para a ação, sentados na privada; ela não tirara a saia e nem a malha preta, somente a calcinha. Ao final da trepada, ela lhe dá um envelope e o beija. Durante o beijo, ele começa a sentir novamente aquele cheiro de sangue, e as vozes lhe diziam: "quebre a cabeça dela na borda da privada", aquilo era mais forte que ele, não era algo questionável e sim, uma ordem.
 - Caddy?
 - Hum?
 - Prometo que não vai doer, tá?
 - Sobre o que tu está faland...
 Antes que ela pudesse terminar, ele a pega pelos cabelos e estava tudo feito. Um som seco e mais nada. Saiu do bar sem olhar para os lados e nem para trás, saiu inclusive sem pagar sua bebida. Neste momento, uma poça de sangue se formava ao redor do corpo da garçonete. Tocava Tom Waits na  jukebox.
 Assoviava.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Loop


- Ei, posso usar teu cinzeiro?
- Pega aí.
- Ultimamente eu tenho fumado demais, sabe com é: casos fracassados, emprego de merda, morando sozinha...
- Sei.
- Olha só, eu ia me sentar naquela outra mesa ali. Tu te importa se eu ficar aqui, contigo?
- Eu não acho uma boa idéia, mas sinta-se à vontade.
- Por que tu não acha boa idéia?- perguntou ela, já se sentando.
- Porque eu não te conheço, e mesmo assim com o pouco que tu já disse, eu pude saber o suficiente.
- Como assim?!
- "Casos fracassados": isso quer dizer que tu foi abandonada por eles. Para ser largada por tanto cara, coisa boa não é.
- Pode ser o contrário. - disse ela, bebericando a cerveja e manchando a borda do copo com batom.
- Pior ainda. Não estou minimamente interessado em ser atirado por aí, a qualquer momento. E morando sozinha, já deve ter enlouquecido. Eu não tenho mais fibra pra aguentar mais uma louca.
- Do jeito que tu fala, parece que sou sempre a culpada.
- Hahaha! Não sei lidar com pessoas. Prefiro ficar sozinho.
- Mas eu gostei da tua sinceridade. É melhor assim.
- Não tenho parâmetros de comparação. Nunca fui diferente disso pra poder dizer se é melhor ou pior.
Ele acende outro cigarro e pede mais uma cerveja. Ela o olha fixamente e diz:
- É melhor eu ir pra outra mesa, então...
- Também acho.
- Mas eu gostei de conversar contigo, apesar de tudo.
- Eu já vi o suficiente. Sei que se ficássemos juntos, é certo que eu iria me fuder. Prefiro não te conhecer e nem saber teu nome.
Ela se levanta e sai, no momento em que o garçom traz a cerveja, e este comenta:

- Cara, quase toda a vez que tu vem aqui eu vejo esta mesma cena se repetindo. E é sempre a mesma mina!
Ele não diz nada.
Acaba com a cerveja.
Paga a conta.
Vai embora.
Chega em casa.
Senta no sofá.
E morre.
Como tem feito todo dia, aliás.

Sem volta

- De um certo ponto adiante não há mais retorno. Esse é o ponto que deve ser alcançado - disse o maltrapilho barbudo que mijava na parada de ônibus enquanto eu passava. Não dava pra se enchergar nada que estivesse a 5m de mim, por causa do nevoeiro, mas aquelas caminhadas noturnas ajudavam a pensar, colocar tudo em ordem e achar uma saída desse maldito labirinto que todos nós criamos, talvez de propósito, dentro de nossas cabeças. Aquele sujeito estava certo (também pudera, a frase pertencia à Kafka), no entanto a única coisa que eu sabia é que eu era um cretino incorrigível e não havia retorno. O nevoeiro ficava mais denso e de novo eu me via aguentando as consequencias de meus próprios atos.
O juiz já bateu o martelo, cara.
Culpado.

O casal - PARTE 1: SANGUE

 Estavam casados há 17 anos, não tinham filhos e moravam numa casa que ela herdara do pai. Ele era redator de um jornal local e ela era dona de uma loja de lingerie. Não se pode dizer que o relacionamento deles fosse normal, iam quase todos os fins de tarde sentar em um banco específico de uma praça, banco este onde se beijaram pela 1ª vez; era uma tentativa um tanto infantil de resgatarem uma visceralidade adolescente.
 Mas eles levavam isso muito à sério, degladiavam na cama e estupravam-se um ao outro, resultando em sangue e escoriações diversas, em situações que beiravam o canibalismo.

 Ele estava passando recentemente por problemas psiquiátricos, alegava que ouvia vozes que o mandavam fazer coisas, como dirigir na contramão a 180 Km/h, calçar os sapatos trocados e empurrar pessoas em
frente a carros que passavam, além da masturbação em público.
 Certa vez ao chegar em casa, encontra sua mulher num tubinho preto e botas de vinil.
 - Amor? - chama ela.
 - Hum?
 - Queria te pedir uma coisa...
 - Que é?
 Então ela se aproxima lentamente e cochicha algo em seu ouvido. Aquele era o dia do aniversário dela e a história deles estava prestes a tomar outro rumo, havia um incenso de ópio aceso, e assim que o mesmo se apaga, ele começa a sentir um cheiro, o mesmo cheiro que ele sentia antes de executar aqueles atos malucos: o de sangue.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Master latin lover Mastroianni level 9999

 - Dê-me um motivo pra te amar, pra ser uma mulher - ela me disse.

 As pessoas precisam constantemente de provas, como na história daquele casal que vivia pelado no mato, fumado e consumindo tudo quanto era planta, numa eterna, eterna trip. Aí, a  mulher, curtindo um barato dos mais violentos, começa a conversar com uma cobra, que disse à ela que as maçãs de um tal pomar abriam as portas da percepção. Então ela come a maçã (que só era maçã na cabeça dela, na verdade eram botões de peiote) e oferece pro cara. Ele nega, entretanto ela diz:
 - Pô, bicho, se tu tens realmente amor por mim nesse astral-sideral-lumilumiscente-fluxicodeiforme, tu deves provar.
 Ele dá uma mordida e eles ficam numa eterna bad, bad trip.
 De repente, um carro cantando pneu ao dobrar a esquina me tira do devaneio. Todo mundo levanta a cabeça, talvez estivessem também lá com seus devaneios.

 - E então, não vai me dizer nada?
 Olhei pra ela, fiz uma cara de Marcello Mastroianni, e lhe disse:
 - Escuta, boneca, estou muito acima deste tipo de preocupação.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Zona

-Pensei em rimar "chocalho" com "caralho", será que fica bom?
-Diabos, tu sempre tem que meter palavrão no meio. Tente uma coisa mais lírica.
-Tipo "meretriz" com "feliz"?
-...
Enquanto os dois discutiam, a lava dum vulcão transformava o velho heremita numa caveira, o pintassilgo caía do galho ao executar a dança do acasalamento, o Lobisomem portoalegrense continuava jogando sinuca com Carl Marx e o sambista caminhava na ponta dos pés, como quem pisava nos corações que rolavam dos cabarés.
...
-Tu precisa sair da zona de conforto, cara.
-Hein?
-ZONA DE CONFORTO!
-Ah, entendi. Puteiro, né?

O casal - PARTE 2: MONÓLOGO

 -Talvez tu não precise disso, ou talvez precise mais do que imagina, mas a questão é: isso irá lhe dar uma plena satisfação, ou não passará de um desejo, um mero impulso? Sabe, querida, eu tentei ser sensato, mas tuas idéias estavam me apavorando, não conseguia dormir direito nem trabalhar, tomava porre de
whiskey toda noite pra esquecer das tuas loucuras.
 Eu sei, fomos felizes e tals, mas bem que a gente poderia mudar o nosso banco daquela praça, mendigos dormem ali, sabe, mijam e cagam também. Melhor, poderíamos mudar de praça, ou de país, ou simplesmente ficar em casa, tu me conhece, não gosto de lugares públicos, as pessoas me dão ânsia de vômito, principalmente os membros da tua família. Não me force a isto, a gente pode tentar mil coisas ainda, ouviu? Ana...? Ana...? Ana!

 Ele continuava apertando firmemente o pescoço dela, com ambas as mãos, conforme ela havia pedido; e então ele cai na gargalhada, perante a língua roxa e os olhos esbugalhados de sua esposa. Antes de pôr o corpo no porta-malas do carro, ele nota uma correspondência na caixa:
- Mas que diabos, vão cortar a TV a cabo de novo!
O sol estava nascendo, com vários feixes de luz se espalhando para todos os lados, e aos poucos ilumina toda a rua. No vidro traseiro do carro que já ia longe, percebe-se algo escrito:
"LAVE-ME".

Pão com puta merda

 Dois cacetinhos velhos e uma reba de Baré-Cola. Foi isso o que ele viu ao abrir a geladeira, e se pôs a pensar quando é que esse negócio de ser escritor ia começar a dar dinheiro. Suas calças estavam remendadas e os sapatos eram os mesmos de sempre, o do pé direito já estava quase falando, com a sola do bico descolada, sem falar do estado de seu paletó. Mas escrevia bem, seu último conto era sobre um sujeito que era pago para executar palhaços e também aqueles que se fantasiavam de Quico.
 Ele estava justamente tentando acabar este conto quando abriu a geladeira, então juntou alguns trocados e foi à venda. Ao retornar, coloca as compras em cima da mesa, e de repente, uma onda de otimismo o invade, "o troço vai deslanchar, de agora em diante", pensa, "é, vai sim, sou um escritor, e meus poemas são de trincar os ossos". Então ele infla o peito e fica repetindo pra si mesmo:"sou foda, cara, fodástico, é isso aí!". Ele começa a ter várias idéias geniais para escrever. Aí senta-se na cadeira e come um pão com mortadela.
 E se engasga.

Corda

Alguma coisa se perdera naquela noite, durante filosofias baratas e Nietzsche tomando absinto, de ceroulas.
Uma corda jogada no abismo?
Sempre fomos além do chão, contrariando nossas avós, que diziam que do chão não se passa.
-Tô te achando muito decadente, cara.
-Decadente!? Impossível, nunca estive no auge.

Previsão do tempo

Ele estava completamente escalavrado e fudido. Era só mais um dia ruim, pensava; nenhum de seus ídolos havia passado por aquilo. Coitado, deveria ter visto a previsão do tempo para aquele dia: "chuva ácida e furacões em áreas isoladas."

terça-feira, 15 de maio de 2012

Mandrake e sua gangue de tietes zumbis devoradoras de corações

Eu era, enfim, um escritor conhecido e bastante requisitado para sessões de leitura, e aquilo estava acabando comigo. Voltava para casa com a voz um tanto rouca.
-Não perca a cabeça- diziam-me escritores experientes.
 Mas aquilo era difícil, visto o assédio que eu sofria.O que parecia uma noite comum, acabou se tornando num inferno.
 Tietes me espreitavam no escuro. Pude somente ver seus olhos brilhando, as retinas eram risquinhos verticais. Aí, um sujeito vestido de Mandrake pula duma árvore, dá um tiro na lua e grita:
-Peguem-no!
 Eu sabia o que queriam, e elas sabiam que eu sabia disso.
 Não era a primeira vez que nos encontrávamos e, receio, não seria a última.

terça-feira, 8 de maio de 2012

Fechou o cerco na C.B.

 O meu nariz é um bom conhecedor de jabs, cruzados, cadeiras, portas e o próprio asfalto, só não aprendeu a desviar deles; não comigo, bêbado, no controle. É um alvo, a 1ª coisa a ser acertada por qualquer coisa.
 Queria ser como os...Hunos. É. Um Huno, montado num cavalo, de lança na mão, berrando e quebrando e pondo fogo em tudo, causando o terror e o escambau; saqueando vilarejos, arrastando aldeãs e essa merda toda. O Rapto das Sabrinas.
 -VEM!
 -Mas...e os meus pais?
 -NÃO VOU PEDIR DE NOVO!
 Ontem fechou o cerco na Cidade Baixa ("alternativos", humpf), enquanto eu bebia tranquilamente. Do lado de cá era foda, sempre foi, embora o território fosse neutro. Antes do troço estourar de vez, ouve-se uma vozinha abafada, lá no fundo:
 -Detenham os Hunos!

 Merda.